Vista parcial da feirinha do Joaquim Romão.
Falar do colorido das feiras livres já se tornou lugar comum. Quanto à diversidade de raças e classes sociais que transitam euforicamente entre os labirintos das barracas, a pechincha chantagiosa da clientela mais esperta e a persuasão emotiva dos comerciantes, deixo aos cuidados da sociologia popular. Ponho-me aqui a tratar de algo que, apesar de extraordinário, ninguém ainda se preocupou em abordar. Talvez porque não esteja à venda, embora, exposto em frenético movimento, se ofereça aos olhares mais atentos, gratuitamente. É das pernas das mulheres que estou falando! Em meio às frutas e verduras, abertas sobre o chão, suadas, sequiosas por um pouco d’água, debatem-se nervosas como cobras armadas para o bote. As pernas… De graça elas (as mulheres) não dão e também não botam preço. “Se quiser, coma com os olhos”, me disse a dona de um par delas.
Dependesse de mim, seqüestrava-as para a minha alcova inóspita, e, sem mais cuidados, esvaía-me em suor até atingir o êxtase de um gozo sujo, vulgar e sem requintes. As mulheres da feira são mais mulheres! Elas ficam a me pirraçar com os seus olhinhos impossíveis, sainhas, vestidinhos, shortinhos, tudo inho, mas… sem carinho, sem cumplicidade, só vontade. Eu tenho como moeda os olhos. Os meus olhos pagam qualquer preço por um decote insensível; eles têm a fome dos meninos sem nome que se humilham a porta da padaria. A feira com o seu teto de plástico e as suas vigas de madeira velha retém o cheiro das cores e ofusca a luz do dia, instaurando um clima bucólico. O comércio da feira não entra nas estatísticas da economia, é tudo muito efêmero. Não dá para mensurar quanto se vendeu, quantos empregos foram gerados, quanto se perdeu, quem roubou ou quem foi roubado.
A feira é um escândalo! Entedia os puritanos e faz rir os imorais.