De que modo deve a classe operária lutar para vencer o capitalismo? É esta a questão primordial que se coloca todos os dias aos trabalhadores. Quais os meios de acção eficazes e quais as tácticas que necessitarão de empregar para conquistar o poder e vencer o inimigo? Não existe nenhuma ciência ou teoria que lhes possa indicar com precisão o caminho a seguir.
É tacteando, deixando exprimir o seu instinto e a sua espontaneidade que encontrarão o caminho. Quanto mais o capitalismo se desenvolve e se propaga por todo o mundo, maior é o poder dos trabalhadores. Novos modo de acção mais apropriados vêm juntar-se aos antigos. As tácticas da luta de classes têm necessariamente de se adaptar à evolução social. O sindicalismo surge como a forma primitiva do movimento operário num sistema capitalista estável. O trabalhador independente não tem defesa face ao patrão capitalista. Por isso os operários se organizaram em sindicatos. Estes reúnem os operários na acção colectiva e utilizam a greve como arma principal.
O equilíbrio do poder fica assim mais ou menos realizado; acontece mesmo inclinar-se mais fortemente para o lado dos operários, de tal modo que os pequenos patrões isolados se vêem impotentes perante os grandes sindicatos. É por isso que, nos países em que o capitalismo está mais desenvolvido, os sindicatos de operários e de patrões (sendo estes as associações, os trusts, as sociedades etc.) estão constantemente em luta.Foi na Inglaterra que nasceu o sindicalismo paralelamente aos primeiros vagidos do capitalismo.
Em seguida estender-se-ia aos outros países, como fiel companheiro do sistema capitalista. Conheceu condições particulares nos Estados Unidos, onde a quantidade de terras livres a desabitadas que se oferecia aos pioneiros escoou a mão-de-obra para fora das cidades; como consequência, os operários obtiveram salários elevados e condições de trabalho relativamente boas.
A Federação Americana do Trabalho constituía uma verdadeira força no país e a maior parte das vezes, foi capaz de manter um nível de vida suficientemente elevado entre os operários que nela estavam filiados.Em tais condições a ideia de derrubar o capitalismo não podia germinar no espírito dos trabalhadores americanos. O capitalismo oferecia-lhe uma existência estável e fácil. Não se consideravam como uma classe à parte cujos interesses fossem opostos à ordem existente; eram parte integrante dela e estavam conscientes de poderem ter acesso a todas as possibilidades que lhes oferecia um capitalismo em desenvolvimento num novo continente. Havia espaço suficiente para acolher milhões de indivíduos, europeus na sua maioria. Era preciso oferecer a esses milhões de colonos um industria em expansão na qual os operários, dando mostras de energia e de boa vontade, poderiam elevar-se à categoria de operários livres, de pequenos comerciantes ou mesmo ricos capitalistas.
Não é surpreendente que a classe operária americana tenha sido imbuída de um verdadeiro espírito capitalista.O mesmo aconteceu em Inglaterra. Tendo assegurado o monopólio do mercado mundial, a supremacia nos mercados internacionais e a posse de ricas colónias, a Inglaterra acumulou uma fortuna considerável. A classe capitalista, que não tinha que se bater pela sua parte de lucro, podia conceder aos operários um modo de vida relativamente desafogado. É certo que teve de travar algumas batalhas antes de se decidir a adoptar esta atitude, mas depressa compreenderia que, autorizando os sindicatos e garantindo os salários, assegurava a paz nas fábricas. A classe operária inglesa foi então por sua vez marcada pelo espírito capitalista.Tudo isto está bem de acordo com o verdadeiro carácter do sindicalismo.
O objectivo do sindicalismo não é substituir o sistema capitalista por um outro modo de produção, mas melhorar as condições de vida no próprio interior do capitalismo. A essência do sindicalismo não é revolucionária mas conservadora.
A acção sindicalista faz parte naturalmente da luta de classes. O capitalismo assenta num antagonismo de classes, tendo os operários e os capitalistas interesses opostos. Isto é verdade, não só no que diz respeito à manutenção do regime capitalista, mas também no que se refere à repartição do produto nacional bruto. Os capitalistas tentam aumentar os seus lucros – a mais valia – diminuindo os salários e aumentando o número de horas ou a cadência do trabalho. Os operários, por seu lado, procuram aumentar os seus salários e reduzir os seus horários. O preço da sua força de trabalho não é uma quantidade determinada, embora deva ser superior ao que é necessário para que um indivíduo não morra de fome; e o capitalista não paga de boa vontade. Este antagonismo é assim gerador de reivindicações e da verdadeira luta de classes. A tarefa e o papel dos sindicatos consiste em continuar a luta.
O sindicalismo foi a primeira escola de aprendizagem do proletariado; ensinou-lhes que a solidariedade estava no centro do combate organizado. Incarnou a primeira forma de organização do poder dos trabalhadores. Esta característica muitas vezes se fossilizou nos primeiros sindicatos ingleses e americanos que degeneraram em simples corporações, evolução tipicamente capitalista. Tal não aconteceu nos países onde os operários tiveram de se bater pela sua sobrevivência, onde, apesar de todos os seus esforços, os sindicatos não conseguiram obter uma melhoria do nível de vida e onde o sistema capitalista em plena expansão empregava toda a sua energia a combater os trabalhadores. Nesses países, os operários tiveram de apreender que só a revolução os poderia salvar para sempre.
Existe sempre uma diferença entre a classe operária e os sindicatos. A classe operária deve olhar para além do capitalismo, enquanto que o sindicalismo está inteiramente confinado nos limites do sistema capitalista. O sindicalismo só pode representar uma parte, necessária mas ínfima da luta de classes. Ao desenvolver-se, deve necessariamente entrar em conflito com a classe operária, a qual pretende ir mais longe.Os sindicatos crescem à medida que se desenvolvem o capitalismo e a grande indústria, até se tornarem gigantescas organizações que integram milhares de adeptos, se estendem por todo um país e têm ramificações em cada cidade e em cada fábrica. São nomeados funcionários: presidentes, secretários, tesoureiros, dirigem os negócios, ocupam-se das finanças tanto à escala local como a nível central. Estes funcionários são os dirigentes dos sindicatos. São eles que conduzem as negociações com os capitalistas, tarefa em que se tornaram mestres.
O presidente de um sindicato é um personagem importante que trata de igual para igual o patrão capitalista e com ele discute os interesses dos trabalhadores. Os funcionários são os especialistas do trabalho sindical, enquanto que os operários especializados, absorvidos pelo seu trabalho na fábrica, não podem nem deliberar nem dirigir por si próprios.Uma tal organização já não é unicamente uma assembleia de operários; forma um corpo organizado, que possui uma política, um carácter, uma mentalidade, tradições e funções que lhe são próprias. Os seus interesses são diferentes do da classe operária e não recuará perante nenhum combate para os defender. Se algum dia os sindicatos perdessem a sua utilidade, ainda assim não desapareceriam. Os seus fundos, os seus adeptos, os seus funcionários, são outras tantas realidades que não estão a ponto de se dissolverem de um momento para o outro.Os funcionários sindicais, os dirigentes do movimento operário, são os defensores dos interesses particulares dos sindicatos. Apesar das suas origens operárias, adquiriram, após longos anos de experiência à cabeça da organização, um novo caracter social.
Em cada grupo social que se torna suficientemente importante para constituir um grupo à parte, a natureza do trabalho molda e determina os modos de pensamento e de acção. O papel dos sindicalistas não é o mesmo que o dos operários. Eles não trabalham na fábrica, não são explorados pelos capitalistas, não são ameaçados pelo desemprego. Estão instalados em gabinetes, em lugares relativamente estáveis. Discutem questões sindicais, têm a palavra nas assembleias de operários e negoceiam com os patrões. Decerto, devem estar do lado dos operários, cujos interesses e reivindicações contra os capitalistas devem defender. Mas nisso, o seu papel em nada difere do do advogado de uma organização qualquer.Existe contudo, uma diferença, porque a maior parte dos dirigentes sindicais, saídos das fileiras da classe operária, sofreram eles próprios, a experiência da exploração capitalista. Consideram-se como fazendo parte da classe operária, cujo espírito de classe está longe de se extinguir. No entanto, o seu novo modo de vida tende a enfraquecer neles essa tradição ancestral. No plano económico, já não podem ser considerados como proletários. Eles caminham ao lado dos capitalistas, negoceiam com eles os salários e as horas de trabalho, cada parte fazendo valer os seus próprios interesses, rivalizando do mesmo modo que duas empresas capitalistas. Apreendem a conhecer o ponto de vista dos capitalistas tão bem como o dos trabalhadores; preocupam-se com os “interesses da indústria”; procuram agir como mediadores. Pode haver excepções ao nível dos indivíduos, mas regra geral, não podem ter esse sentimento de pertencerem a uma classe como têm os operários, pois que estes não procuram compreender nem tomar em consideração os interesses dos capitalista, mas lutam pelos seus próprios interesses. Por conseguinte os sindicalistas entram necessariamente em conflito com os operários.
Nos países capitalistas avançados, os dirigentes sindicais são suficientemente numerosos para constituir um grupo à parte, com um carácter e interesses separados. Na qualidade de representantes e dirigentes dos sindicatos, encarnam o carácter e interesses desses sindicatos. Visto que os sindicatos estão intrinsecamente ligados ao capitalismo, os seus dirigentes consideram-se elementos indispensáveis à sociedade capitalista. As funções capitalistas dos sindicatos consistem em regular os conflito de classe e assegurar a paz nas fábricas. Por conseguinte, os dirigentes sindicais consideram ser seu dever como cidadãos trabalhar pela manutenção da paz nas fábricas e intrometer-se nos conflitos. Nunca olham para além do sistema capitalista. Estão inteiramente ao serviço dos sindicatos e a sua existência está indissoluvelmente ligada à causa do sindicalismo. Para eles, os sindicatos são os órgãos mais essenciais à sociedade, a única fonte de segurança e de força; devem, por conseguinte, ser defendidos por todos os meios possíveis.Concentrando os capitais em poderosas empresas, os patrões encontram-se numa posição de força em relação aos operários. Os grandes magnates da industria reinam como monarcas absolutos sobre as massas operárias que mantêm sob a sua dependência e que impedem de aderir aos sindicatos. Por vezes acontece que estes escravos do capitalismo se insurgem contra os seus senhores e fazem greve, reclamando melhores condições de trabalho, horários menos carregados, o direito de se organizarem.
Os sindicalistas acorrem em sua ajuda. É então que os patrões fazem uso do seu poder político e social. Expulsam os grevistas de suas casas, mandam matá-los por milícias ou mercenários, prendem os seus porta-vozes, declaram ilegais as suas caixas de socorros mútuos. A imprensa capitalista fala de caos, de violência, de revolução, e dirige a opinião pública contra os grevistas. Após vários meses de tenacidade e sofrimentos heróicos, esgotados e desiludidos, incapazes de fazer vergar a estrutura de aço do capitalismo, os operários rendem-se, remetendo para mais tarde as suas reivindicações.A concentração de capitais enfraquece a posição dos sindicatos, mesmo nos ramos de actividade em que são mais fortes. Apesar da sua importância, os fundos de apoio aos grevistas mostram-se ínfimos comparados com os recursos financeiros do adversário. Um ou dois lok-out bastam para os esgotar inteiramente. O sindicato é então incapaz de lutar, mesmo quando o patrão decide reduzir os salários e aumentar as horas de trabalho. Resta-lhe aceitar as condições desfavoráveis do patronato e a sua habilidade para negociar não lhe serve de nada.
É nesse momento que os aborrecimentos começam, pois os operários querem lutar. Recusam render-se sem combate e sabem pouco ter a perder se se revoltarem. Os dirigentes sindicais, pelo contrário têm muito a perder: o poder financeiro dos sindicatos e, por vezes, a sua própria existência é ameaçada. Assim, tentarão por todos os meios impedir um combate que consideram não ter saída. E procurarão convencer os trabalhadores que é do seu interesse aceitar as condições do patronato. De tal modo que, em ultima análise, agem como porta-vozes dos capitalistas. A situação é ainda mais grave quando os operários persistem em querer continuar a luta, sem ter em conta as palavras de ordem dos sindicatos. Nesse caso, a força sindical vira-se contra os trabalhadores.O dirigente sindical torna-se assim escravo da sua função – a manutenção da paz nas fábricas – e isto em detrimento dos operários, se bem que pretenda defender os interesses destes o melhor possível. Visto que não é capaz de olhar para além do sistema capitalista, em pensar que a luta é inútil.
Aí se situam os limites do seu poder e é sobre isso que a crítica deve incidir.Existe outra saída? Podem os operários esperar ganhar qualquer coisa ao lutar? É bem provável que não obtenham satisfações imediatas, mas ganharão outra coisa, porque ao recusarem submeter-se sem combate, atiçam o espírito de revolta contra o capitalismo. Formulam novas reivindicações e torna-se então essencial que o conjunto da classe operária as defenda. É-lhes necessário mostrar a todos os trabalhadores que para eles não há esperança no interior das estruturas capitalistas e que só podem vencer unidos, fora dos sindicatos. É então que começa a luta revolucionária. Quando todos os trabalhadores compreenderem esta lição, quando se desencadearem greves simultaneamente em todos os ramos da indústria, quando rebentar uma vaga de revolta pelo país, então talvez nasçam algumas dúvidas nos corações arrogantes dos capitalistas; vendo o seu poder ameaçado, consentirão em fazer algumas concessões.O dirigente sindical não pode compreender este ponto de vista, pois que o sindicalismo não pode olhar para além do capitalismo. Ele não pode deixar de se opôr a um combate deste género que significa a sua perda. Sindicatos e patrões estão unidos no receio comum de uma revolta do proletariado.Quando os sindicatos se batiam contra a classe capitalista para obter melhores condições de trabalho, esta detestava-os mas não tinha possibilidade de os destruir completamente. Se hoje os sindicatos tentassem despertar o espírito combativo da classe operária, seriam perseguidos sem piedade pela classe dirigente, que reprimiria as suas acções, mandaria a milícia destruir os seus gabinetes, prenderia os seus dirigentes e condená-los-ia a multas, confiscaria os seus fundos. Se, pelo contrário, impedissem os seus adeptos de lutar, seriam considerados pela classe capitalista como preciosas instituições; seriam protegidos e os seus dirigentes seriam considerados dignos cidadãos.
Os sindicatos encontram-se assim entalados entre dois males: por um lado as perseguições que são uma triste sorte para pessoas que se pretendem cidadãos pacíficos; por outro, a revolta dos operários sindicalizados que ameaça abalar os alicerces da organização sindical. Se a classe dirigente for prudente, reconhecerá a utilidade de um simulacro de luta, se quiser que os dirigentes sindicais conservem uma certa influência sobre os seus membros.Ninguém é responsável por estes conflitos: são a consequência inegável do desenvolvimento do capitalismo. O capitalismo existe, mas encontra-se também no caminho da sua ruína. Deve ser combatido simultaneamente como uma entidade viva e como uma fase transitória. Os operários devem, ao mesmo tempo, lutar incansavelmente para obter salários mais elevados e melhores condições de trabalho, e tomar consciência dos ideais comunistas. Agarram-se aos sindicatos que consideram ainda necessários, procurando de vez em quando fazer deles melhores instrumentos de combate. Mas não partilham o espírito do sindicalismo, que permanece essencialmente capitalista. As divergências que opõem o capitalismo à luta de classes são hoje representadas pelo fosso que separa o espírito sindicalista, principalmente incarnado pelos dirigentes sindicais, da atitude cada vez mais revolucionária dos sindicalizados. Este fosso torna-se evidente sempre que surge um problema político ou social importante.
O sindicalismo está estreitamente ligado ao capitalismo; é nos períodos de prosperidade que tem mais probalidades de ver as suas reivindicações de ver as suas reivindicações salariais satisfeitas. De tal modo que, em período de crise económica, tem de fazer votos para que o capitalismo retome a sua expansão. Os trabalhadores, enquanto classe, não se preocupam nada com o bom andamento dos negócios. Com efeito, é quando o capitalismo está mais fraco que eles têm mais probalidades de o atacar, de reunir forças e dar o primeiro passo para a liberdade e a revolução.O sistema capitalista estende a sua dominação ao estrangeiro, apropriando-se das riquezas naturais de outros países em seu próprio benefício. Conquista colónias, submete as populações primitivas e explora-as não hesitando em cometer as piores atrocidades. A classe operária denuncia e combate a exploração colonial, enquanto que o sindicalismo defende muitas vezes uma política colonialista, fonte de prosperidade para o regime capitalista.À medida que o capital aumenta, as colónias e países estrangeiros são objecto de investimentos maciços. Mercados para a grande industria e produtores de matérias-primas, adquirem uma importância considerável. Para obter estas colónias, os grandes estados capitalistas entregam-se a lutas de influência e procedem a uma verdadeira partilha do mundo. As classes médias deixam-se arrastar nestas conquistas imperialistas em nome da grandeza nacional. Depois os sindicatos colocam-se por sua vez ao lado das classes dirigentes sob pretexto de a prosperidade do país depender do sucesso que retira da luta imperialista.
Por seu lado, a classe operária não vê no imperialismo mais do que uma forma de reforçar o poder e a brutalidade dos opressores.Estas rivalidades de interesses entre as nações capitalistas transformam-se em verdadeiras guerras. A guerra mundial é o coroamento da política imperialista. Para os trabalhadores significa não só o fim da solidariedade internacional, mas também a forma mais violenta de exploração. Porque a classe operária, camada mais importante e mais explorada da sociedade, é a primeira a ser afectada pelos horrores da guerra. Os operários terão não só de fornecer a sua força de trabalho, como também de sacrificar a vida.E, contudo, o sindicalismo em tempo de guerra não pode senão estar do lado do capitalismo. Estando os seus interesses ligados aos do capitalismo, não pode deixar de desejar a vitória deste último. Assim dedica-se a despertar os instintos nacionalistas e o chauvinismo. Auxilia a classe dirigente a arrastar os trabalhadores para a guerra e a reprimir qualquer oposição.O sindicalismo tem horror ao comunismo, que representa uma ameaça constante à sua própria existência. Em regime comunista não há patrões nem, por conseguinte, sindicatos. Claro que nos países onde existe um forte movimento socialista e onde a grande maioria dos trabalhadores são socialistas, os dirigentes do movimento operário têm também de ser socialistas. Mas trata-se de socialistas de direita que se limitam a desejar uma república na qual honestos dirigentes sindicais substituiriam os capitalistas ávidos de lucro à cabeça da produção.
O sindicalismo tem horror à revolução que subverte as relações entre patrões e operários. No decorrer dos seus violentos confrontos, ela varre de um só golpe os regulamentos e as convenções que regem o trabalho; perante essas gigantescas manifestações de força, os modestos talentos de negociantes dos dirigentes sindicais são ultrapassados. Esta a razão porque o sindicalismo mobiliza todas as suas forças para se opôr à revolução e ao comunismo.
Esta atitude é rica em significações. O sindicalismo constitui uma verdadeira força. Dispõe de fundos consideráveis e de uma influência moral cuidadosamente mantida nas suas diversas publicações. Esta força está concentrada nas mãos dos dirigentes sindicais que a utilizam de cada vez que os interesses particulares dos sindicatos entram em conflito com os dos trabalhadores. Embora tenha sido construído pelos e para os operários, o sindicalismo domina os trabalhadores, do mesmo modo que o governo domina o povo.O sindicalismo varia segundo o país e segundo a forma do desenvolvimento capitalista. Pode também passar por fases no interior de um determinado país. Acontece haver sindicatos que perdem a sua força e aos quais o espírito combativo dos operários insufla um sopro de vida, ou até os transforma radicalmente. Na Inglaterra, nos anos de 1880-90, um “novo sindicalismo” surgiu assim das massas pobres, dos estivadores, e outros trabalhadores não especializados e sub-remunerados rejuvenescendo as estruturas anquilosadas dos antigos sindicatos.
O aumento do número de trabalhadores manuais vivendo em condições lamentáveis é uma das consequências do desenvolvimento da capitalismo que cria sem cessar novas indústrias e substitui os trabalhadores especializados por máquinas. Quando, reduzidos às suas últimas forças, estes trabalhadores seguem o caminho da revolta e da greve, adquirem finalmente uma consciência de classe. Remodelam as estruturas do sindicalismo, de maneira a adoptá-las a uma forma mais avançada do capitalismo. Na verdade, quando o capitalismo ultrapassa este limiar, o novo sindicalismo não pode escapar à sorte que espera qualquer forma de sindicalismo e produz, por sua vez, as mesmas contradições internas.O novo sindicalismo iria aparecer particularmente na América, com os I.W.W. (International Workers of the World), nascido de duas formas de desenvolvimento capitalista. Nas vastas regiões de florestas e planícies do Oeste, os capitalistas apropriaram-se das riquezas naturais por métodos brutais a que os operários-aventureiros responderam com a violência e a selvajaria. No Leste dos Estados Unidos, a indústria ir-se-ia, pelo contrário, desenvolver à custa da exploração de milhões de pobres imigrados vindos de países de baixo nível de vida e que foram submetidos a condições de trabalho miseráveis.Para lutar contra o espírito estreitamente corporativo do velho sindicalismo americano – a Federação Americana do Trabalho, que dividia os operários de uma fábrica em vários sindicatos separados -, os I.W.W. propuseram que todos os operários de uma mesma fábrica se unissem contra o patrão no interior de um sindicato único.
Condenando as rivalidades mesquinhas que opunham os sindicatos entre si, os I.W.W. iriam voltar-se para esta fracção mais miserável do proletariado e conduzi-la para a luta. Eram demasiado pobres para pagar as cotas elevadas e constituir sindicatos tradicionais. Mas quando se revoltaram e se puseram em greve, foram os I.W.W. que os ensinaram a lutar, que juntaram fundos de apoio através do país e que defenderam a sua causa na imprensa e perante os tribunais. Alcançando uma série de vitórias, viriam a insuflar no coração das massas o espírito de organização e de responsabilidade. E enquanto que os antigos sindicatos jogavam na sua riqueza financeira, os I.W.W. apoiaram-se na solidariedade, no entusiasmo e nas capacidades de resistência dos trabalhadores. Em vez da estrutura rígida dos velhos sindicatos, os I.W.W. propuseram uma forma de organização flexível, variando quanto ao número conforme a situação, com efectivos reduzidos em tempo de paz, desenvolvendo-se com a luta. Recusando o espírito conservador e capitalista do sindicalismo americano, os I.W.W. preconizavam a revolução. Os seus membros foram perseguidos sem piedade pelo conjunto do mundo capitalista. Foram lançados na prisão e torturados com base em falsas acusações. O direito americano chegou mesmo a inventar um novo delito: o “criminal syndicalism”.Como método de luta contra a sociedade capitalista, o sindicalismo industrial, não é suficiente para, por si só, derrubar essa sociedade e conquistar o mundo para os trabalhadores. Combate o capitalismo sob a sua forma patronal, no sector económico da produção, mas não se pode declarar contra o seu baluarte político, o poder estatal. Contudo, os I.W.W. foram até hoje a forma de organização mais revolucionária na América. Contribuiu mais do que qualquer outra para despertar a consciência de classe, a solidariedade e a unidade do proletariado, para reivindicar o comunismo e para estimular as suas armas de combate.O sindicalismo não pode vencer a resistência do capitalismo.
Esta a lição que se deve depreender do que anteriormente se disse. As vitórias que alcança trazem apenas soluções a curto prazo. Mas as lutas sindicais não são menos essenciais e devem prosseguir até ao fim, até à vitoria final.A incapacidade do sindicalismo nada tem de surpreendente, pois que se um grupo isolado de trabalhadores se pode mostrar numa justa correlação de forças quando se opõe a um patronato isolado, é porém, impotente face a um patrão que é apoiado pelo conjunto da classe capitalista. É o que se passa neste caso: o poder estatal, a força financeira do capitalismo, a opinião pública burguesa, a virulência da imprensa capitalista concorrem para vencer o grupo de trabalhadores combativos.Quanto ao conjunto da classe operária, não se sente envolvido pela luta de um grupo de grevistas. Sem dúvida que a massa dos trabalhadores nunca é hostil a uma acção de greve: pode até chegar a empreender colectas para apoiar os grevistas – com a condição de não serem proibidas por ordem de um tribunal. Mas esta simpatia não vai mais longe: os grevistas permanecem sós, enquanto milhões de trabalhadores os observam passivamente. E a luta não pode ser ganha (salvo em casos particulares quando o patronato decide, por razões económicas, satisfazer algumas reivindicações) enquanto o conjunto da classe operária não estiver unido neste combate.A situação é diferente quando os trabalhadores se sentem directamente implicados na luta; quando compreendem que o seu futuro está em jogo.
A partir do momento em que a greve se generaliza ao conjunto da indústria, o poder capitalista tem de enfrentar o poder colectivo da classe operária.Muitas vezes se disse que a extensão da greve, e a generalização ao conjunto das actividades de um país, era o meio mais seguro para assegurar a vitória. Mas é preciso não ver nesta táctica um esquema prático que possa ser utilizado em qualquer altura com êxito. Se assim fosse, o sindicalismo não teria deixado de a utilizar constantemente. A greve geral não pode ser decretada, segundo o humor dos dirigentes sindicais, como uma simples táctica. Não deve surgir senão das entranhas da classe operária, como forma de expressão da sua espontaneidade; e não se deve efectuar senão quando a essência do combate ultrapassa largamente as simples reivindicações de um só grupo. Então, os trabalhadores colocarão verdadeiramente todas as suas forças, o seu entusiasmo, a sua solidariedade e a sua capacidade de resistência na luta.E terão necessidade de todas as suas forças, porque o capitalismo mobilizará por seu lado, as suas melhores armas. Poderá ser surpreendido por esta repentina demonstração de força do proletariado e poderá ver-se obrigado, num primeiro momento, a fazer concessões. Mas não passará de um recuo temporário. A vitória do proletariado não está assegurada nem é duradoira. O seu caminho não está claramente traçado, mas deve ser trilhado através da selva capitalista à custa de imensos esforços.
Contudo, cada pequena vitória é em si um progresso, porque arrasta consigo uma vaga de solidariedade operária: as massas toma consciência da força da sua unidade. Através da acção os trabalhadores compreendem melhor o que significa o capitalismo e qual é a sua posição em relação à classe dirigente. Começam a vislumbrar o caminho da liberdade.A luta sai assim do domínio estreito do sindicalismo para entrar no vasto campo da luta de classes. Cabe então aos próprios trabalhadores mudar. Precisam alargar a sua concepção do mundo e olhar, para além das paredes da fábrica, para o conjunto da sociedade. Devem elevar-se acima da mesquinhez que os rodeia e fazer frente ao Estado. Penetram então no reino da política. É tempo de se preocuparem com a revolução.
Por Anton Pannekoek